quarta-feira, 23 de junho de 2010

Briony, o 2 e os 2 bilhões...

"Esses pensamentos lhe eram tão familiares e tão confortadores quanto a configuração exata de seus joelhos, sua aparência igual porém contrastante, simétrica e reversível. Um segundo pensamento sempre vinha após o primeiro, um mistério gerava outro: seriam todas as demais pessoas realmente tão vivas quanto ela? Por exemplo, seria sua irmã realmente importante para si própria, tão valiosa para ela mesma quanto Briony era? Ser Cecília seria uma coisa tão intensa quanto ser Briony? Sua irmã também teria um eu verdadeiro por trás da onda que se quebrava, e passaria tempo pensando nisso, com o dedo quase encostado na cara? E as outras pessoas, inclusive seu pai, e Betty, e Hardman? Se a resposta fosse sim, então o mundo, o mundo social, era insuportavelmente complicado, dois bilhões de vozes, os pensamentos de todo mundo a se debater, todos com igual importância, investindo tanto na vida quanto os outros, cada um se achando o único, quando ninguém era único. Era possível afogar-se naquele mar de irrelevância. Mas se a resposta fosse não, então Briony estava cercada de máquinas, inteligentes e agradáveis vistas de fora, mas sem aquele sentimento vivo oculto, interior, que Briony tinha. Era uma idéia sinistra e desoladora, além de improvável. Pois, por mais que seu senso de ordem se sentisse agredido, ela sabia que era muitíssimo provável que todo mundo tivesse pensamentos como os dela. Isso ela sabia, mas apenas de um modo um tanto árido; não conseguia senti-lo de verdade."

Ian McEwan - Reparação

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